terça-feira, 25 de maio de 2010

Politização Já!


A palavra "política", segundo a wikipedia, "tem origem nos tempos em que os gregos estavam organizados em cidades-estado chamadas 'polis', nome do qual se derivaram palavras como 'politiké' (política em geral) e 'politikós' (dos cidadãos, pertencente aos cidadãos), que estenderam-se ao latim "politicus" e chegaram às línguas européias modernas através do francês 'politique' que, em 1265 já era definida nesse idioma como 'ciência do governo dos Estados'." Ainda define a enciclopedia da rede, como "arte ou ciência da organização, direção e administração de nações ou Estados; aplicação desta arte aos negócios internos da nação (política interna) ou aos negócios externos (política externa)". Essa palavra com origens há mais de dois milênio tomou diversas formas e sentidos nas diversas sociedades que buscaram emprestar-lhe os significados a sua época e contexto. Até os tempos modernos, política nunca se desassociara de sua essência. Nasceu da organização do estado e da cidade e nunca se distanciou do sentido de coletividade e sociedade, o que sempre exigiu aos que administram agrupamentos humanos um saber (ciência) aliado a um dom (arte). Mas algo mudou na humanidade nestas últimas décadas a ponto de política ter novo sentido?
Provocou-me tal questionamento um trecho da entrevista dada por Marco Aurélio Garcia, assessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para assuntos internacionais em entrevista a Andréa Vieira, da revista Desafios do Desenvolvimento, do Ipea, e publicada pelo Azenha no Viomundo. Ao tratar do tema "combate à corrupção", Garcia destaca que se por um lado, a corrupção se torna mais visível justamente pelo aumento do seu combate como demonstram o volume de iniciativas da Controladoria Geral da União e da Polícia Federal, por outro há uma leitura feita desse combate pela imprensa, que, segundo supõe Garcia, tem como função, desacreditar a política, tornando-a "uma área ardida" e os políticos, "as piores pessoas que existem no mundo". Prossegue : "O volume que esses temas ocupam no noticiário e a abordagem deles denotam concretamente uma incriminação da política como atividade humana. E ela é muitas vezes substituída por uma ideia de que ao invés da política nós devemos privilegiar a gestão. Uma gestão do tipo tecnocrática, apolítica e etc."
O que se denuncia aqui é justamente o esvaziamento do significado maior da palavra "política". Passa a significar, endossada por mídias mal intencionadas, uma atividade obscura que somente gente inescrupulosa possa exercer. Essa mesma mídia "acusou" a greve dos professores do Estado de São Paulo em 2010, de "política". Como se existisse greve e movimento sindical apolítico, ou como se o devesse ser. Isso ressoa no pensamento coletivo que já é avesso ao sindicalismo graças ao colonialismo brasileiro, como uma abominação. O Estado militar, com forte repressão, tortura e assassinatos, negou aos brasileiros por três décadas, pensar, falar ou fazer política. A democracia reconquistada, direta ou indiretamente, pelos criminalizados "subversivos" e "comunistas", encontrou um Brasil despolitizado. A Democracia que se construiu daí, por sua vez, se consolidou em um sistema não participativo, mas representativo. As pessoas delegam a alguns poucos o poder de legislar e executar políticas públicas. A relação entre os representantes e seus representados se dá basicamente pelo meio da propaganda eleitoral, mídia e o voto. Poucos são aqueles que exercem sua cidadania de forma participativa, seja pelo sindicato, associação, movimentos sociais ou partidos, dentre outros. Os representados podem sair desses agrupamentos, mas como a imensa maioria da população não está engajada em qualquer organização política, para ser eleito, qualquer representado terá de ir muito além de sua base. Terá de gastar muito dinheiro para ganhar cada voto, e poderíamos dizer, comprar cada voto. Pois se precisa de propaganda não deixa de passar pela cabeça do eleitor que pensa como consumidor que se trata de um produto. A credibilidade desse produto depende da mídia (mal intencionada ou não), de marqueteiros e novas embalagens que o tornem conhecido e mais apetitoso aos olhos do freguês. E se é preciso dinheiro, e muito, para se eleger, naturalmente, esse sistema atrairá a corrupção e os grupos dominantes de poder secular. O dinheiro não aparecerá sem interesses. O dinheiro entra com o objetivo de vantagens. E quem banca não está pensando em política. São empresas, empresários, intermediários, donos de corporações. E quanto maior a corrupção, mais o cidadão comum, assalariado, com uma mãozinha da mídia, sente-se cada vez mais distante da política. Fecha-se o círculo vicioso.
Esse círculo que de um lado tem a despolitização e do outro a corrupção é alimentado pela mídia, em especial, porque essa não quer uma relação muito participativa dos cidadãos na política. Cidadãos mais politizados são menos crédulos diante dos meios de comunicação herdeiros do Brasil colonial. Uma herança da qual as 11 famílias que controlam rádio e televisão no país não vão abrir mão. A consequência , o distanciamento entre o telespectador do Jornal Nacional e do BBB e a política, deixa abertos os espaços políticos. Também interessa a esses feudos o fortalecimento de representantes (seus) que carreguem o atribito de "gestores" em detrimento dos "políticos". Na medida em que a política se torna atividade carregada de descrédito e ceticismo, o cidadão em aversão a ela, menos participa. Política costuma ser assunto proibido em algumas mesas de bar e contra a etiqueta em casa de amigos. Seja no sindicato, no conselho da escola ou no condomínio do prédio, faz-se política e decide-se independentemente dos afetados gostarem ou não de política. Tal aversão permite que as cadeiras vagas acabem preenchidas em boa parte, por mal intencionados. Esse ciclo somente pode ser rompido com a participação. Mas a participação envolve responsabilidade, o que muitas pessoas preferem abrir mão. Por vezes, é mais cômodo reclamar da escola, do síndico, do sindicato ou dos políticos. Para quebrar tal ciclo somente com conscientização, que não brota espontaneamente nas cabeças dos indivíduos. Requer educação, formação, capacitação. Para mudar tal panorama, temos muito trabalho pela frente. Política não pode ser tabu. Nas escolas públicas, as leis da mordaça, herança da ditadura servem de desculpa para não se discutir política. Mas o que existe é uma massa despolitizada que cultua que política é algo ruim, sem perceber que o fazem o tempo todo e que o dia-a-dia e seus destinos são definidos na política. Nos sindicatos, a mesma estratégia da despolitização tem tomado o lugar que antes era dado à consciência de classe. Tudo pelo status quo ou pela manutenção dos mesmos no poder. Não moro em condomínio, mas alguma coisa tento fazer já que sou educador e sindicalista. Na creche em que sou gestor, política e educação têm que andar juntas. As pequenas crianças que frequentam todos os dias devem constituir-se autônomas, orgulhosas de si e curiosas, pois terão um mundo muito desigual e uma sociedade que precisa ser transformados. Em nada os professores poderão ajudar se acharem que seu trabalho não é político. No sindicato que participo e milito, defendo que a entidade assuma a formação política dos participantes, já que a postura que vejo na diretoria é a cômoda culpabilização da categoria pelo desmobilização. Tento fazer minha parte ainda, escrevendo esse blog (dentre outros). Temos de assumir uma nova campanha para combater a mídia: politização já!

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